INFORMATIVO Nº 463 TCU
- LICITLAB

- 4 de ago. de 2023
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Foi publicado, no dia 25 de julho de 2023, o Informativo de Licitações e Contratos nº 463, que aborda um tema de licitação. Veja:
Em licitação promovida por empresa estatal, pode o instrumento convocatório estabelecer limitação temporal de atestados para comprovação de qualificação técnica (art. 58, inciso II, da Lei 13.303/2016), desde que essa exigência esteja devidamente motivada e não restrinja o caráter competitivo do certame.
Ao apreciar representação que apontava possíveis irregularidades na Licitação Eletrônica 2022/04603, promovida pelo Banco do Brasil (BB) com vistas à “contratação de contact center, com fornecimento de infraestrutura, para prestação de serviços à Central de Relacionamento do Banco do Brasil – CRBB, na cidade de Recife/PE”, o Pleno do TCU, por meio do Acórdão 727/2023-Plenário, decidiu, entre outras providências, cientificar a entidade da seguinte impropriedade identificada no referido certame: “c.2) estipulação de restrição temporal dos atestados de capacidade técnica, por meio do item 10.3.4.2.5 do edital do certame, em desacordo com a jurisprudência do TCU, a exemplo dos Acórdãos 2.163/2014-TCU-Plenário e 2.032/2020-TCU-Plenário”.
Em face do conteúdo do aludido item “c.2”, o BB opôs embargos de declaração alegando, entre outros aspectos, que o julgado incorrera em omissão ao deixar de se manifestar quanto ao disposto no item 9.2 do Acórdão 18.965/2021-2ª Câmara. O mencionado dispositivo dera ciência ao BB sobre impropriedade identificada na Licitação Eletrônica 2020/0244, que tivera por objeto a contratação de serviços continuados de outsourcing para operação de almoxarifado virtual, “de que a ausência de justificativa técnica quanto à exigência de limitação temporal, para fins de habilitação técnica, de atestados dos serviços prestados de maneira concomitante, contraria os princípios da motivação e da competitividade (art. 2º do Regulamento de Licitações e Contratos do BB)”.
Segundo o embargante, esse dispositivo permitiria ao BB, em situações excepcionais e com a devida fundamentação, exigir a apresentação de atestados de capacidade técnica limitados a determinado período. Entre as irregularidades apontadas nesse certame, constara a exigência de habilitação técnica relativa à temporalidade dos serviços prestados a 1.500 municípios por três meses, “dentro dos últimos 12 meses”, contrariando “o princípio da competitividade (art. 2º do Regulamento de Licitações e Contratos do BB) e a jurisprudência do TCU, a exemplo do Acórdão 2.032/2020- TCU-Plenário”.
Diante desse fato, de acordo com o embargante, restariam comprovadas, em relação ao objeto da Licitação Eletrônica 2022/04603, ora em debate, peculiaridades que justificariam a exigência, a exemplo do tipo de serviço licitado, além de sua relevância e extensão para o atual desenvolvimento das atividades bancárias. Destarte, a exigência de que o licitante comprovasse experiência na prestação do serviço em período recente mostrar-se-ia, a seu ver, “não apenas razoável, mas recomendada”, ante a necessidade de que a empresa prestadora de serviços “esteja atualizada em relação às mais recentes normas de regulação, técnicas de treinamento de pessoal e de atendimento ao cliente”.
Com base nas suas argumentações, o BB requereu o conhecimento dos embargos com efeito infringente, alterando-se o julgado no sentido de “admitir a possibilidade de limitação temporal dos atestados de capacidade técnica, desde que a restrição seja devidamente justificada”. Em seu voto, o relator salientou, preliminarmente, que, no voto condutor da decisão invocada pelo embargante (Acórdão 18.965/2021-2ª Câmara), consignara-se que os argumentos apresentados pelo BB, naquela oportunidade, não foram suficientes para demonstrar o cabimento das “minuciosas exigências” de capacidade técnica no requisito de limitação aos últimos doze meses.
Nesse sentido, transcreveu o seguinte excerto daquele voto: “17. Como resultado, verificou-se baixa concorrência na licitação, uma vez que somente três empresas compareceram ao chamamento, sendo que apenas duas apresentaram propostas. 18. Na linha defendida pela Selog, entendo que os argumentos trazidos pelos gestores não foram suficientes para demonstrar o cabimento das exigências minuciosas de capacidade técnica constantes dos itens 8.3.10 a 8.3.10.2 do edital. Em que pese a distribuição territorial das agências bancárias pelo País, o requisito de limitação aos últimos 12 meses para a comprovação do atendimento às exigências não foi justificado pelo Banco do Brasil. 19. Con sidero que a restrição temporal nesse caso age no sentido de limitar o número de participantes e interessados no certame, e tem pouca utilidade como critério de seleção de licitantes mais capacitados para bem cumprir o objeto da licitação. 20. Isso porque o incentivo que o limite temporal para comprovação das exigências dá ao mercado é de que o interesse do Banco é contratar uma empresa que tenha prestado os serviços no último ano, nas condições estritas estabelecidas no edital.
A observância dessa condição não necessariamente significa que os serviços tenham sido prestados pelas firmas mais habilitadas tecnicamente. Portanto, entendo adequada a expedição de ciência ao Banco do Brasil, nos termos do art. 9º, inciso I da Resolução-TCU 315/2020, de forma a orientar a atuação do Banco controlado pelo poder público”. Posto isso, o relator manifestou-se no sentido da rejeição da tese do embargante de que o item 9.2 do Acórdão 18.965/2021-2ª Câmara “constitui autorização taxativa para que o Banco do Brasil possa estabelecer limitações temporais aos atestados de capacidade técnica, pois, a uma, pela falta de caráter normativo de uma decisão de abrangência incidental, a duas por se tratar, em essência, de ciência de irregularidade que visou reorientar a atuação da unidade jurisdicionada, de forma a evitar que limitações à competitividade sem justificativas plausíveis viessem novamente ser adotadas”.
Nada obstante, considerou que a decisão embargada apresentava, sim, omissão ao não considerar que, de acordo com o paradigma estabelecido pela Lei 13.303/2016, o legislador “logrou por ultimar, por meio do inciso II do art. 58 daquele Estatuto, que os parâmetros para aferição da qualificação técnica seriam estabelecidos pelo instrumento convocatório”. Chamou a atenção ainda para o fato de que a unidade técnica destacara a ausência de irregularidade na exigência de experiência mínima de três anos de execução de serviço com objeto similar ao licitado no certame em tela, ressaltando, inclusive, que tal exigência estava de acordo com a jurisprudência do TCU, segundo a qual, para fins de qualificação técnico-operacional, pode-se exigir comprovação de experiência mínima na execução de serviços continuados semelhantes ao objeto da contratação em lapso temporal superior ao prazo inicial do contrato, a exemplo do Acórdão 14.951/2018-1ª Câmara; todavia, o problema apontado pela unidade instrutiva fora a exigência de que os atestados de capacidade técnica fossem restritos aos últimos três anos, o que, para ela, iria de encontro à jurisprudência do Tribunal, no sentido de que “é indevido o estabelecimento de limitações temporais ou quantitativas em relação ao número ou antiguidade das certidões apresentadas com o objetivo de comprovar a qualificação técnica dos licitantes”.
O relator afirmou que, de fato, a jurisprudência do TCU repudiava a restrição temporal de atestados, especialmente em função das regras contidas no art. 30, § 5º, da Lei 8.666/1993, e que, de forma semelhante, tal restrição também fora acolhida pela Lei 14.133/2021 (nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos), ao assim dispor: “Art. 67. A documentação relativa à qualificação técnico-profissional e técnico-operacional será restrita a: [...]
§ 1º A exigência de atestados será restrita às parcelas de maior relevância ou valor significativo do objeto da licitação, assim consideradas as que tenham valor individual igual ou superior a 4% (quatro por cento) do valor total estimado da contratação.
§ 2º Observado o disposto no caput e no § 1º deste artigo, será admitida a exigência de atestados com quantidades mínimas de até 50% (cinquenta por cento) das parcelas de que trata o referido parágrafo, vedadas limitações de tempo e de locais específicos relativas aos atestados.” (grifos do relator). Entretanto, ponderou o relator, as licitações do BB são regidas pela Lei 13.303/2016, que estabelece regras para as contratações realizadas por empresas estatais, normativo que traz disposição distinta acerca da qualificação técnica: “Art. 58. A habilitação 3 será apreciada exclusivamente a partir dos seguintes parâmetros: [...] II - qualificação técnica, restrita a parcelas do objeto técnica ou economicamente relevantes, de acordo com parâmetros estabelecidos de forma expressa no instrumento convocatório;” (grifos do relator).
O relator reconheceu que, inicialmente, e em conformidade com o precedente adotado pelo Tribunal no âmbito do Acordão 2.032/2020-Plenário, compreendia que a limitação temporal de atestados configuraria restrição à competitividade, princípio resguardado pelo art. 31, caput, da Lei 13.303/2016. No entanto, “após aprofundar o exame das questões postas”, entendeu que o legislador “logrou por ultimar, por meio do inciso II do art. 58”, que os parâmetros para aferição da qualificação técnica seriam estabelecidos pelo instrumento convocatório, sem prejuízo da obediência aos princípios consagrados no art. 31, caput, da Lei das Estatais.
Concluiu então que a legislação de regência optou por conferir maior autonomia ao administrador no âmbito das estatais, ao remeter o estabelecimento de parâmetros para o edital da licitação, razão por que, “se a limitação temporal de atestados for devidamente motivada, tecnicamente justificável, estiver de acordo com os parâmetros estabelecidos no instrumento convocatório e observar os princípios legais e regulamentares pertinentes, especialmente a busca pela competitividade no certame, não há irregularidade”. Frisou, inclusive, que, em determinadas circunstâncias, “caberá ao gestor motivar se a restrição temporal é de fato a forma mais efetiva de se assegurar a qualificação técnica do licitante frente às mudanças do mercado, pois podem existir situações em que a mera restrição de atestados a períodos curtos e recentes não será suficiente para assegurar a qualificação técnica, visto que não avalia de forma definitiva a experiência do licitante na aplicação de novas tecnologias e metodologias”.
Retornando ao certame em apreço, o relator constatou que dele participaram oito empresas, “tendo sido analisada a documentação apenas da arrematante, que foi habilitada”. Dessa forma, “foi possível concluir que, apesar da estipulação de restrição temporal dos atestados de capacidade técnica, houve satisfatória concorrência entre os licitantes, sem indícios de restrição ao caráter competitivo, principalmente considerando-se a alta materialidade da contratação”.
Ao final, o relator propôs, e o Plenário decidiu, acolher parcialmente os embargos de declaração e tornar insubsistente o item “c.2” do Acórdão 727/2023-Plenário.
Acórdão 1378/2023 Plenário, Embargos de Declaração, Relator Ministro Vital do Rêgo.




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